sábado, 30 de outubro de 2010

HÁ 30 ANOS, NA TV GLOBO

No dia 23 de maio de 1980, às 21 horas, a TV Globo levou ao ar para todo o Brasil, dirigido pelo uberabense e espírita Augusto César Vannucci, um dos mais belos programas já produzidos na televisão em homenagem a alguém. UM HOMEM CHAMADO AMOR, o nome do programa que surgia como apoio e divulgação à campanha do Prêmio Nobel da Paz para Chico Xavier.

O Especial emocionou o povo brasileiro.

Artistas dos mais expressivos do Teatro e da Música participaram com grande brilhantismo e, entre eles, destacamos Tony Ramos, Elis Regina, Lady Francisco, Nair Bello, Glória Menezes, Lima Duarte, Paulo Figueiredo, Vanusa, Eva Vilma, Felipe Carone, Roberto Carlos...

Gilberto Gil compôs em homenagem ao Chico a música No Céu da Vibração, que Elis Regina interpretou como só ela poderia ter feito.

Ao final, Chico psicografou diante das câmeras belíssima página de Emmanuel, aqui inserida, sintetizando o tema abordado ao longo de todo o programa, que, diga-se de passagem, alcançou altíssimos índices de audiência.

Eis a mensagem de Emmanuel:

Amigos, Jesus nos abençoe.
A inteligência humana conseguirá atingir as maiores realizações.
Poderá conhecer a estrutura de outros mundos.
Construir no piso dos mares.
Escalar os mais altos montes.
Interferir no código genético das criaturas.
Decifrar os segredos da vida cósmica.
Penetrar os domínios da mente e controlá-los.
Inventar os mais sofisticados aparelhos que propiciem o reconforto.
Criar estatutos para o relacionamento social e transformá-los, segundo suas próprias conveniências.
Levantar arranhacéus ou materializar as mais arrojadas fantasias.
Entretanto, nunca poderá alterar as leis fundamentais de Deus e nem viver sem amor.


O jornalista Arthur da Távola, sob a inspiração da Campanha do Prêmio Nobel a Chico Xavier, escreveu nas páginas do jornal O Globo, em 26 de maio de 1980, o que consideramos um dos melhores artigos produzidos sobre o médium na imprensa leiga.


A FIGURA DE COMUNICAÇÃO DE FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER

Independente de qualquer posição pessoal, crença ou conviccção, a figura de comunicação de Francisco Cândido Xavier percorre décadas da vida brasileira, operando um fenômeno (refiro-me à comunicação terrena mesmo) de validade única, peculiar, originalíssima. Não vou, portanto, por falta de autoridade para tal, analisá-lo do ângulo religioso e, sim, as relações de sua figura de comunicação com o público.

Com todos os significantes necessários a já ter desaparecido ou ter-se isolado como um fenômeno passageiro, a figura de comunicação de Francisco Cândido Xavier, no entanto, ganha um significado profundo, duradouro, acima e além de paixões religiosas, doutrinas científicas ou interpretações metafísicas.

A inexistência de um tipo físico favorecedor funciona como outro curioso paradoxo a emergir da figura de comunicação de Chico Xavier. Aquele homem de fala mansa, peruca, acentuado estrabismo, pessoa de humildade e tolerância, não configura o tipo físico idealizado do líder religioso, do chefe de seita, do místico impressionante.

A clássica barba dos místicos ou a cabeleira descuidada ou olhar penetrante e agudo dos líderes inexistem no visual de Chico Xavier, Acrescente-se a inexistência, em seu modo de vestir, de qualquer originalidade ou definição de estilo próprio, ainda que contestador dos estilos formais e burgueses.

Não tem, portanto, Chico Xavier, nos aspectos externos e formais de sua figura de comunicação, nenhum dos elementos habitualmente consagrados como funcionais ou impressionantes dos aspectos externos do grande público, elementos de comunicação incorporados consciente ou inconscientemente por figuras importantes nas religiões. Até a figura do Papa líder de uma comunidade religiosa, é envolta em pompa e festa, estratégia visual destinada à maior pregnância de sua mensagem e à definição de sua posição como símbolo. Nem mesmo a mais decidida modéstia e humildade pessoal de vários papas são suficientes para que a figura papal se desvista da pompa e simbologia relativas ao reinado que representa. Até nas religiões orientais, menos pomposas, as figuras líderes são cercadas da visão carismática do líder.

Francisco Cândido Xavier, porém, representa uma espécie de antítese vitoriosa da figura carismática. Não tem, do ponto de vista externo ou visual, nenhum elemento característico. Até ao contrário. Pessoalmente, é o anticarisma. Funciona como símbolo de negação de qualquer pompa ou formalidade, um retorno talvez à pureza primitiva dos movimentos religiosos.

E no entanto emerge da figura dele uma das mais poderosas forças de identificação da vida brasileira. Ele é uma espécie de líder desvalido dos desvalidos, dos carentes, dos sofredores, dos não onipotentes, dos despretensiosos, dos modestos, dos dispostos a perder para ganhar.

Curiosamente, tal posição é conquistada naturalmente e sem qualquer traço político direto de tomada de posição ao lado dos fracos num século em que a revolução social aparece como a tônica e como a grande aglutinadora dos movimentos humanos, inclusive os religiosos. Sem qualquer formulação política, sem qualquer mensagem diretamente relacionada com a exploração do homem, sem qualquer revolta direta e institucionalizada contra a miséria ou a injustiça, Francisco Cândido Xavier emerge com a força do perdão, da tolerância, da fraternidade real, da fraqueza forte, da fé, da humildade e do despojamento erigidos como regra de vida, como trabalho efetivo da caridade; da não pompa; da não hierarquia; da não violência em qualquer de suas manifestações, mesmo as disfarçadas em poder, glória, secretismo, hermetismo, iniciação, poder temporal ou promessa de vida eterna.

A figura de comunicação de Francisco Cândido Xavier emerge, portanto, de uma relação profunda e misteriosa com um certo modo de sentir do homem brasileiro, relação esta ainda insuficientemente estudada ou conhecida até mesmo pelos que a vivem, comandam ou exercem. Até mesmo para ele, Francisco, deve haver muita coisa envolta em mistério, um mistério que os seguidores dele tentam definir e enchem-se de explicações científicas ou cientificizantes, religiosas ou religiosizantes, psicológicas, parapsicológicas ou parapsicologizantes.

Para tal contribui, além do aspecto misterioso da psicografia e da relação com os que morreram, a igualmente misteriosa aura de paz e pacificação que domina os que com ele se relacionam pessoalmente ou via meios de comunicação, na relação cuidada e cautelosa, equilibrada e pouco frequente por ele mantida com a televisão, na qual aparece muito pouco, uma vez por ano no máximo e sempre para grandes públicos.

Além da aura de paz e pacificação que parte dele, há um outro elemento poderoso a explicar o fascínio e a durabilidade da impressionante figura de comunicação de Francisco Cândido Xavier: a grande seriedade pessoal do médium, a dedicação integral de sua vida aos que sofrem e o desinteresse material absoluto. A canalização de todo o dinheiro levantado em direitos autorais para as variadíssimas atividades assistenciais espíritas dão a Chico Xavier uma autoridade moral – tanto maior porque não reivindicada por ele – que o coloca entre os grandes líderes religiosos do nosso tempo.

Quem se aproximar da atividade real de assistência material e espiritual da comunidade espiritualista brasileira verificará que ela é íntegra e heróica, tal e qual o que há e sempre houve de melhor em assistência de religiões como a católica e a protestante (entre nós), prodígios de dedicação, silêncio e humildade que justificam as vidas dos que delas participam.

Síntese final:

A integridade pessoal; a íntima relação entre a pregação e a própria vida; a honestidade de seus seguidores; a ausência completa de significantes externos; o contato com o mistério; a ausência de qualquer forma de violência em sua figura e pregação; a nenhuma subordinação a hierarquias aprisionantes; a discrição pessoal; a nenhuma procura de poder político, temporal ou econômico para o desempenho da própria missão; as formas originais de organização interna do seu movimento, sem personalismos ou autoritarismos – tudo isso gera uma figura de comunicação de alta força, mistério, empatia e grandeza moral, principalmente se considerarmos que enfrentou e ultrapassou tempos diferentes do atual (no qual o ecumenismo felizmente impôs-se). Antes, manifestações como as dele eram removidas como bruxaria ou perigosa, ou bárbaras ou alucinantes quaisquer manifestações místico-religiosas diferentes ou discrepantes da religião da classe dominante.

Este é um capítulo do livro 100 ANOS DE CHICO XAVIER: Fenômeno Humano e Mediúnico, do Dr. Carlos Antônio Baccelli, publicado pela Editora: LEEPP (Livraria Espírita Edições Pedro e Paulo), de Uberaba (MG). Se tiver oportunidade, não deixe de ler.

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