Ilha da Queimada Grande, a 35 quilômetros da costa, litoral sul de São Paulo. É a maior concentração de cobras do Brasil. São mais de 2,5 mil serpentes venenosas, que os pesquisadores tentam preservar a todo custo.
Em cima das árvores, por trás de pedras, escondidas, elas são perigosas, venenosas e estão por toda a parte. As jararacas-ilhoas são mais uma espécie criticamente ameaçada de extinção. Mas este é o santuário delas.
“Essa ilha é única no mundo inteiro. Uma ilha tão isolada, não tem mamíferos, não tem água doce e tem todos esses indícios de espécies de aves residentes, migratórias, marinhas, que formam dessa ilha um lugar único”, diz o ornitólogo Arthur Macarrão.
Para que a ilha não seja o único refúgio das jararacas-ilhoas, 20 serpentes ganharam casa nova no Instituto Butantã, em São Paulo. Em cinco anos, dobraram de número.
O lar paulistano das jararacas-ilhoas fica no biotério dentro do Instituto Butantã, em um local não muito grande.
“Para finalidade que a gente está tendo inicial, da manutenção em cativeiro, que é condicionado as matrizes, as mães para reprodução, esse espaço tem atendido às necessidades. Aqui tem mais de 40 cobras”, explica Otávio Marques, diretor do Laboratório de Ecologia e Evolução do Instituto Butantã.
Ilha é protegida por leis ambientais e só podem desembarcar pesquisadores
O próximo desafio para os pesquisadores é reproduzir, no Butantã, as mesmas condições de temperatura e de estresse da Ilha da Queimada Grande. E por falar na ilha, chegar lá é uma aventura para poucos.
Após uma hora de navegação, já é possível ver a Queimada Grande ainda parcialmente encoberta pela bruma. A parte mais alta dela, que tem 200 metros de altitude.
Os pesquisadores acreditam que entre 15 e 20 mil anos atrás, o planeta esfriou e a água dos mares se acumulou nos polos, em forma de gelo. O nível dos oceanos baixou até 100 metros. Então, muitas ilhas viraram morros. E os animais circulavam livremente pelo novo território. Mas há 11 mil anos, o planeta voltou a esquentar e o gelo derreteu. O nível dos oceanos subiu de novo. Os morros voltaram a ser ilhas. E os animais que lá estavam acabaram isolados.
A ilha é protegida por leis ambientais e só podem desembarcar pesquisadores no local. A equipe de reportagem do Fantástico também, porque estava acompanhada por eles.
As jararacas-ilhoas são primas das jararacas do continente - que, por sinal, causam 80% dos acidentes com cobras no Brasil.
Jararaca-ilhoa prefere a luz do dia porque ela busca os pássaros
A agilidade das jararacas-ilhoas sobre as árvores é o que as diferencia, é uma das grandes diferenças dos parentes do continente. Enquanto a jararaca do continente é mais ativa à noite, porque elas comem os roedores, que são mais ativos à noite, a jararaca-ilhoa prefere o dia, a luz do dia, porque ela busca os pássaros.
“A jararacas-ilhoas ela come pássaros pequenos e migratórios, que são espécies que vêm de outras regiões e passam por aqui, ficam durante um determinado tempo aqui e depois vão embora”, diz Arthur Macarrão.
As aves chegam à ilha entre janeiro e março, e também no inverno, como o tuco-anilha. Depois dessa refeição, comer de novo só no ano seguinte. As ilhoas chegam a ficar até seis meses em jejum.
Pesquisadores pesam, medem e colocam chip para marcar jararacas-ilhoas
Os jovens pesquisadores fazem o processamento das cobras. Eles pesam, medem e colocam um chip para marcar as jararacas-ilhoas.
“Esse chip serve para a gente identificar. Então a gente pesou, mediu, fez toda essa parte, anotou onde a gente encontrou o animal. Então, se a gente volta a encontrar um animal chipado, a gente tem como comparar quanto tempo já faz que a gente viu aquele animal, acompanhar se ele está com peso bom.”, diz a bióloga Karina Banci.
“O chip é um RG. É um número universal e único.”, diz André.
As fêmeas são maiores que os machos. Outra descoberta da pesquisa foi quanto ao veneno das ilhoas, tão perigoso quanto o das primas do continente.
“Se você for acidentado e não correr com o soro antiofídico ou você morre ou você vai ter sequelas graves.”, destaca explica a bióloga Karina Kasperoviczus.
Preservação das serpentes auxiliou no desenvolvimento de remédio
Mas por que preservar uma das serpentes mais perigosas do planeta?
“Foi descoberto, usando o envenenamento experimental, existia uma classe de moléculas no veneno que atuava ajudando a baixar a pressão arterial, isso culminou com o desenvolvimento de um remédio que é o captopril, que é um remédio apropriado para diminuição da angina, no peito”, destaca o biólogo André Zelanis.
As informações ainda são poucas e preciosas. Os pesquisadores não sabem, por exemplo, quanto vive uma jararaca-ilhoa. Estima-se que seja mais de dez anos. Já os perigos, esses são enormes. Um deles é o comércio ilegal.
“Existe interesse comercial principalmente por pessoas que são colecionadoras de serpentes”, diz Karina.
É curioso, a pequena população de jararacas-ilhoas, frágil e preciosa para a ciência, depende, principalmente, da má fama da cobra. Até os pesquisadores concordam: a maior proteção que as jararacas-ilhoas ainda têm é o medo que os humanos têm dela.
“Conhecendo tudo que envolve a história evolutiva desse organismo, a gente conhece um pedacinho da vida. E a gente acaba por entender a nossa evolução também.”, diz o especialista em genética, Felipe Grazziotin.
Assista abaixo, a matéria realizada pelo programa Fantástico, da Rede Globo:
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