Por Giordano Cimadon
Um dos costumes mais populares da celebração da Páscoa é presentear os amigos e familiares com ovos, especialmente ovos de chocolate que são entregues às crianças pelo coelho de Páscoa. Afinal de contas, se a Páscoa é uma festa cristã, e os ovos são elementos simbólicos provenientes das religiões pagãs, os ovos de Páscoa são pagãos ou cristãos?
É bem provável que as celebrações de Páscoa tenham absorvido os ovos por causa da Quaresma. Assim como outros tipos de alimento, o consumo de ovos era proibido durante a Quaresma. O estoque destes alimentos era consumido antes da Quarta-feira de Cinzas, data que até hoje dá início ao período de jejum e penitência.
Durante toda a Quaresma, as galinhas não paravam de botar ovos, resultando num grande estoque que deveria ser consumido com rapidez para que não estragasse. Como a Quaresma termina na Quinta-feira Santa, três dias antes do Domingo de Páscoa, os ovos se tornaram elementos abundantes durante a festividade que celebra a Ressurreição de Jesus.
Além deste evento econômico, existem lendas na tradição cristã que buscam incorporar os ovos de Páscoa ao Cristianismo, especialmente ao Cristianismo Oriental. Uma delas afirma que Maria Madalena trazia ovos cozidos para repartir com outras mulheres que estavam próximas à tumba de Jesus, e os ovos, que representariam a pedra que fecha o túmulo, ficaram vermelhos quando as mulheres viram Jesus ressuscitado.
Outra lenda conta que Maria Madalena, em seus esforços para divulgar o Evangelho, fez uma visita ao Imperador de Roma e o saudou dizendo “o Cristo ressuscitou”. Ao ouvir tal saudação que lhe pareceu absurda, o Imperador apontou para um ovo que estava sobre a mesa e disse ”o Cristo ressuscitou tanto quanto este ovo é vermelho”. Imediatamente o ovo ficou milagrosamente tingido de vermelho sangue.
É evidente que tais lendas não são aceitas por todos, e mesmo aceitando que os ovos façam parte da tradição cristã, não é possível descartar tantas evidências de que em tempos anteriores ao Cristianismo os ovos já eram usados para representar a mensagem central da Páscoa, a passagem da morte para a vida, na forma da Ressurreição de Jesus.
Ao longo de pelo menos 3000 anos, na Pérsia, ovos são pintados como forma de celebrar o Noruz, a festa tradicional que celebra o Ano Novo do calendário persa. No Irã, ovos coloridos são colocados à mesa de jantar durante o Noruz, e a mãe come um ovo cozido para cada filho. A palavra Noruz significa “novo dia” em persa, numa clara referência ao equinócio da primavera, quando os dias passam a se tornar gradativamente mais longos, no hemisfério norte.
Por outro lado, não só os ovos, mas também o coelho, são elementos simbólicos encontrados nas festividades da deusa germânica da fertilidade Eostre, cujo nome é equivalente ao do mês de abril, quando geralmente acontecem as celebrações de Páscoa. Eostre é a deusa da aurora e da fertilidade, e assim como com o Noruz, é evidente a sua associação com a primavera.
Não é nenhuma novidade que, assim como a maioria das festas cristãs, a Páscoa também foi enriquecida com características e costumes originárias de outras tradições. Aliás, a própria figura redentora e ressuscitada de Jesus, o aspecto virginal de Maria e muitos dos dogmas cristãos foram importados de outras culturas.
Entender que a celebração da Páscoa é sincrética e não puramente cristã, serve para compreender de forma definitiva que as religiões que nascem incorporam os simbolismos das religiões precedentes. E isso convida à reflexão sobre a universalidade daquilo que inspira a religiosidade humana, que é a ânsia da alma pela experiência gnóstica.
Fonte: www.sgi.org.br
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